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Cuidando dos que ficam

Psicologia
26. julho .2019

Cuidando dos que ficam

Cuidando dos que ficam

 Sofrer de uma doença grave que possa interromper a vida é com certeza uma experiência impactante emocionalmente para quem está doente, mas não se pode esquecer que os familiares e amigos passam por isso juntos. Não estão com a enfermidade em seus corpos, mas estão, em maior ou menor grau, à mercê de um desgaste emocional desse processo.

 Se você conhece uma pessoa que está passando por uma situação de ter um ente querido em sua fase final de vida, talvez precise se atentar para alguns aspectos que poderão ajudá-lo a oferecer o melhor apoio possível.

 Tenha em mente que além dos sentimentos e angústias que são suscitados por se deparar com a fragilidade e finitude do seu ente querido, ainda é possível que a reação dos demais nesse momento também seja algo que te mobilize. Nesse sentido, as intenções naturais se direcionam na tentativa de ajudar os outros, fazer com que não sofram. O ponto aqui é que talvez isso não seja possível.

 A dor de perder alguém é algo individual e único e será vivida somente pelo portador da mesma. Não temos como tirar o sofrimento de ninguém, aliás, nesse sentido ainda corremos o risco de desmerecermos suas reações. Por isso, se um dos familiares começar a chorar, gritar ou tiver outras reações mais exacerbadas, opte por verificar se há alguma comorbidade, como pressão alta, diabetes, cardiopatia, que possa se descompensar nesse momento.

Verifique se os remédios de uso contínuo foram ingeridos nas doses e horários corretos (uma pessoa que está perdendo um ente querido pode confundir-se). Evite o uso indiscriminado de calmantes, principalmente se o plano é fazer o familiar ingerir sem perceber. O remédio (natural ou não) pode entorpecer a dor momentaneamente, mas não irá evitar a perda, postergando a reação à mesma. Nesses casos, é comum que pessoas não possam aproveitar os momentos ao lado do familiar porque se sentem dopadas ou incapacitadas.

 É preciso reconhecer que esse é um momento muito delicado na vida de qualquer um, e que pode se tornar ainda mais quando consideramos as crianças diante desse contexto. Em relação a elas, um ponto que gera muitas dúvidas é se é indicada ou não a presença de crianças nesses momentos.

 É preciso lembrar que a pessoa que está partindo continua sendo ela mesma até o último minuto de sua vida. Muitas vezes a criança tinha um convívio muito próximo, sente falta de ver e pede para que seja levada até o familiar. Assim, certifique-se de que a criança compreende o que está acontecendo, conforme suas capacidades cognitivas, do que se trata o quadro do familiar. Explique como o ente querido está: se está dormindo, se está com máscara de oxigênio, tomando medicações, etc. É possível que o imaginário da criança não alcance a realidade à qual ela vai encontrar. Vale ressaltar que você precisará desenvolver esse conteúdo em uma linguagem acessível, e assim conseguir explicar o que lhe espera.

 Pergunte abertamente se ela deseja vê-lo, se tem algo que a preocupa, se está com medo. A sinceridade dessa comunicação não impositiva pode permitir que a criança seja sincera também. Cuide para não invalidar os sentimentos que a criança referiu estar sentido com frases do tipo: “Você já é um hominho, não está com medo, não é mesmo?”, “Você é uma criança muito forte, não vai chorar quando vir seu avô”, “Na sua idade com medo de coisa boba como um quarto de hospital”.

 Lembre-se que cada idade corresponde a um grau de desenvolvimento, mas que cada ser humano tem o seu próprio ritmo. Algumas crianças de 5 anos podem apresentar um enfrentamento mais saudável do que algumas de 10 anos, por exemplo.

 Esteja junto ao levar a criança para fazer a visita a alguém que está morrendo. É imprescindível que ela sinta que não está sozinha e que pode sair a qualquer momento. Respeite a decisão da criança se ela optar por não fazer a visita. Forçá-la ou induzi-la pode transformar esse momento que poderia ser afetivo em uma situação traumática.

 Seguindo esses cuidados não é possível garantir que não haverá tristeza e sofrimento, mas que talvez esse momento, que por si pode ser tão sofrido, ocorra de uma forma mais acolhedora.

Fonte: Gisele dos Santos, geriatra, e Ronny Kurashiki, psicólogo. Os profissionais fazem parte da equipe do Valencis Curitiba Hospice.

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